Era uma
chance de o Tribunal Superior Eleitoral equiparar-se a outras instâncias do
Judiciário identificadas com a linha de frente na luta contra a corrupção.
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Os ministros do Tribunal Superior Eleitoral - Editoria de Arte |
Por O GLOBO
Era uma chance de o Tribunal Superior
Eleitoral equiparar-se a outras instâncias do Judiciário identificadas com a
linha de frente na luta contra a corrupção. Entre elas, o Supremo, a 13ª Vara
da Justiça Federal de Curitiba, base do juiz Sergio Moro e da força-tarefa da
Lava-Jato; o juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio de
Janeiro; e Vallisney de Souza Oliveira, da 1ª Vara Federal de Brasília.
Não se pode acusar de
ilegítima a decisão da Corte de inocentar a chapa Dilma-Temer. Há argumentos
técnicos que embasam os 4 a 3 a favor da manutenção da chapa, com a permanência
de Michel Temer no Planalto.
Mas é um contraponto
forte que, entre os três votos derrotados, estejam dois ministros do Supremo,
Luiz Fux e Rosa Weber, que podem se pronunciar depois que a denúncia contra
Temer por corrupção for encaminhada à Corte, pelo procurador-geral da
República, Rodrigo Janot. O ministro Edson Fachin, destinatário da denúncia, a
enviará à Câmara, para que seja aprovada ou não, sendo necessária maioria de
três quintos dos votos (60%). Se aprovada, a denúncia irá ao Pleno da Corte, em
que Fux e Rosa Weber têm assento. O terceiro voto contra Temer, no TSE, foi do
competente relator, ministro Herman Benjamin.
Em uma Justiça
entulhada de agravos, embargos e leis que se sobrepõem e, não raro, se
contradizem, não é difícil encontrar lastro para defender teses que agridam a
sensatez, inclusive driblem entendimentos jurídicos anteriores. O embate no TSE
começou a ficar claro na manhã de quinta, quando, sob a presidência do também
ministro do STF Gilmar Mendes, a Corte passou a discutir preliminares. O
desfecho do debate jurídico é exemplo bem acabado da margem de manobra que
existe no cipoal de leis, regulamentos, para se tomar decisões legais, em
sentido contrário ao de leis também em vigor. Pois, apesar do entendimento
majoritário, no TSE, de que depoimentos e provas colhidas junto à Odebrecht
chegaram ao processo depois de prazos vencidos, a lei complementar 64, de 1990,
sustenta que o juiz formará a sua opinião por “livre apreciação dos fatos
públicos e notórios, dos indícios e presunções e provas produzidas (...), ainda
que não indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse
público de lisura eleitoral” .
O enredo é de realismo
fantástico, no qual o partido que foi autor da petição inicial contra a chapa
Dilma-Temer, o PSDB, tornou-se aliado do vice-presidente, quando Dilma sofreu
impeachment por crimes de irresponsabilidade fiscal.
Ainda em desdobramentos
de difícil entendimento para quem não acompanha o cotidiano da política e da
Justiça brasileiras, o ministro Gilmar Mendes, o mesmo que, em 2015, se bateu,
com razão, para reabrir o inquérito sobre o uso de dinheiro sujo na campanha de
2014, por Dilma-Temer, passou a aceitar a tese de que o relatório de Benjamin
fosse rejeitado por incluir depoimentos da Odebrecht e dos marqueteiros João
Santana e Mônica Moura, devido a questiúnculas processuais. Testemunhos
corrosivos sobre desvios de dinheiro público para a campanha da chapa vitoriosa
deixaram de ser considerados formalmente. Por isso, o relator desfechou a frase:
“Eu, como juiz, recuso o papel de coveiro de prova viva. Posso até participar
do velório, mas não carrego o caixão."
Gilmar de 2015 havia
antecipado Benjamin de 2017, ao conseguir reabrir a análise das contas de
Dilma-Temer, mandadas arquivar pela então ministra Maria Thereza de Assis
Moura, hoje fora da Corte. Daí o relator haver citado com frequência um
incomodado Gilmar Mendes. A não inclusão da Odebrecht no relatório de Benjamin
recebeu, na quinta, o primeiro apoio explícito, do ministro Napoleão Nunes Maia
Filho. Depois vieram Admar Gonzaga e Tarcísio Vieira, recém-nomeados para o TSE
pelo presidente Temer. Quanto a Gilmar, já havia deixado evidente que era
contra a amplitude do relatório. Tratou o trabalho de Benjamin como uma
competente tese acadêmica, útil para ajudar em reformas futuras, mas não para
cassar a chapa. O relator disse que entendia a intenção dos pares: “arrancar
(do processo) todas as provas da Odebrecht”.
A tranquilidade e até
animação do presidente Michel Temer, na quarta-feira, no segundo dia do
julgamento, demonstradas em solenidade no Planalto, se justificavam. Restou do
julgamento o detalhado relatório de Herman Benjamin, candidato a ocupar lugar
entre as melhores peças de acusação que têm sido produzidas desde o mensalão,
neste ciclo histórico de luta das instituições republicanas contra a corrupção.
Temer venceu esta
batalha e precisa se preparar para a próxima, a da denúncia contra ele que a
procuradoria-geral da República encaminhará ao STF. Enquanto isso, o Congresso
não pode parar. O lado positivo desses dias tensos é que o país segue: a
Justiça funciona, investigações na Lava-Jato e outras operações prosseguem, e o
Congresso trabalha.
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